Fonte: Revista Pesquisa Fapesp,
Jul/2012 (http://revistapesquisa.fapesp.br)
Uma das soluções seria ingerir o
alimento cozido à temperatura superior a 90 ºC
Isis Nóbile Diniz | Edição Online
28 de março de 2012
Um grupo de pesquisadores
brasileiros avaliou os impactos de diferentes graus de poluição na criação da
ostra-do-pacífico em Florianópolis, capital de Santa Catarina, responsável por
95% da produção do molusco no Brasil. Em busca de um diagnóstico sobre as
condições dos animais comercializados, o estudo publicado em fevereiro na
Ecotoxicology and Environmental Safety confirmou que as ostras podem acumular
em seu organismo compostos químicos e agentes como vírus, bactérias e
protozoários, causadores de doença em pessoas. Esses organismos podem provocar
infecções, principalmente em quem ingere o alimento cru. A pesquisa também mostrou
que moluscos provenientes de locais de criação de ostras continham vírus mesmo
quando os locais de cultivo apresentavam níveis aceitáveis de coliformes
fecais, segundo resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).
Situações críticas foram encontradas em animais experimentalmente colocados em
ambientes mais poluídos, não usados como criadouros.
A ostra (Crassostrea gigas) se
alimenta dos plânctons que vivem à deriva no mar, e faz isso sugando e
filtrando a água. “Além do próprio alimento, ela absorve outros compostos
químicos e orgânicos que estão na água que ser morta ou se infectar com esses
vírus, bactérias e protozoários. Eles ficam retidos no tecido do animal,
protegidos de agressões como a radiação ultravioleta do Sol”, conta a coordenadora
do estudo Célia Regina Monte Barardi, do Laboratório de Virologia Aplicada do
Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Universidade
Federal de Santa Catarina (UFSC). As ostras podem acumular metais, pesticidas e
outros compostos orgânicos em seus tecidos e nas brânquias, chegando a
concentrações maiores do que as presentes na água do mar. Portanto, a qualidade
dos moluscos comercializados está relacionada às condições sanitárias das águas
onde são cultivadas.
Áreas analisadas pelos
pesquisadores
O estudo foi realizado em
parceria com o Núcleo de Estudos em Patologia Aquícola e Centro de Ciências
Agrárias e Laboratório de Biomarcadores de Contaminação Aquática (ambos da
UFSC), Laboratório de Química Orgânica Marinha da Universidade de São Paulo
(USP) e Laboratório de Protozoologia da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp). Os pesquisadores inseriram ostras provenientes do Laboratório de
Cultivo de Moluscos Marinhos (UFSC), situado em Sambaqui (veja mapa) em quatro
locais: Ribeirão da Ilha (número 1 no mapa) e Santo Antônio de Lisboa (2), onde
atualmente há cultivo de moluscos; Tapera (3), com cultivo desativado devido à
proximidade da costa e tráfico intenso de barcos, o que causam a contaminação
do mar; e foz do rio Bücheler (4), impróprio para cultivo por receber despejo
de esgoto.
A água do mar e os sedimentos
foram analisados no momento em que os pesquisadores deixaram as ostras e 14
dias depois, quando as recolheram. A equipe verificou por meio de análise
microbiológica a contaminação dos moluscos por vírus que atacam humanos,
compostos orgânicos, protozoários e bactérias como coliformes fecais,
eliminados pelas fezes e urina das pessoas, além de metais pesados, derivados
de petróleo e pesticidas despejados no mar.
Como esperado, as ostras
coletadas da foz do rio Bücheler, o mais poluído dos quatro locais estudados,
continham um maior número de patógenos humanos: adenovírus (que pode causar
infecção nas vias respiratórias, conjuntivite ou gastroenterite), norovírus (principal
causa não bacteriana de gastroenterite aguda), vírus da hepatite A,
poliomavírus (perigoso para pessoas com baixa imunidade) e coliformes fecais.
Pesticidas, hidrocarbonetos e esteroides também foram encontrados dentro das
ostras retiradas próximas ao rio Bücheler. Já as coletadas na antiga área de
cultivo Tapera continham norovírus, coliformes fecais e o protozoário
Cryptosporidium spp., que pode desencadear problemas intestinais.
As ostras coletadas nas duas
áreas usadas atualmente para cultivo, Ribeirão da Ilha e Santo Antônio de
Lisboa, apresentaram menor quantidade de desencadeadores de doenças comparados
às outras regiões analisadas. Porém, como eles filtram a água do mar, os
moluscos provenientes dessas regiões ainda correm risco eventual de
contaminação. Isso porque ambos os locais estão sujeitos a receber a entrada de
esgoto doméstico, rural, urbano tratado e não tratado e poluentes, como
derivados do petróleo.
“Uma solução para quem gosta dos
moluscos seria ingerir o alimento cozido, pode ser ‘no bafo’ (vapor), a uma
temperatura superior a 90 ºC. Essa ação inativa vírus, protozoários e
coliformes fecais”, explica a pesquisadora. Porém, não elimina pesticidas ou
metais pesados.
“Outra maneira de proteger a
população da contaminação por microrganismos, pesticidas ou metais pesados
seria cultivar a ostra em água limpa”, conta Célia. Com o objetivo de reduzir o
risco de contaminação por microrganismos causadores de doença, os pesquisadores
da UFSC, entre eles uma das autoras do estudo Doris Sobral Marques Souza, estão
testando pequenos depuradores em forma de tanques. “A água desses depuradores é
esterilizada com luz ultravioleta. Como a ostra se alimenta ao filtrar a água,
esperamos que a permanência dos moluscos dentro dos tanques com água do mar
purificada pela radiação ultravioleta, diminua a quantidade dos contaminantes
retidos pelas ostras”, diz a pesquisadora. A ideia é instalar equipamentos
dentro de restaurantes e estabelecimentos que comercializam o molusco.
http://revistapesquisa.fapesp.br/2012/03/28/ostras-podem-acumular-agentes-causadores-de-doen%c3%a7as-comprova-pesquisa/
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